Crack não é brincadeira de criança

Oi gente, hoje trago um assunto sério e deveras polêmico, mas recente (digo, de controvérsias recentes, afinal, a pauta data décadas atrás) e muito relevante: a situação na Cracolândia. A “terra do crack” é uma região no centro de São Paulo onde se desenvolveu e intensificou o tráfico de drogas, além da forte presença da prostituição. É claro que a discussão é longa e ampla, mas o enfoque desse post será voltado às crianças que enfrentam o cenário das drogas.

Na cracolândia não há só traficante, há mães e filhos, esses quais muitas vezes são vítimas, inocentes no meio em que estão inseridos e que, independente de seu contexto, vão para creches e escolas. De acordo com a estimativa de 2013 do Movimento Estadual da População em Situação de Rua de São Paulo, são mais de 1.200 crianças e adolescentes envolvidos com crack nas ruas paulistanas, e, como afirma o desembargador Antonio Carlos Malheiros, coordenador da Vara de Infância e Juventude do Tribunal de Justiça de São Paulo; desses, entre 200 e 400 vivem na cracolândia. A situação nessa região não é nem remotamente adequada para se criar uma criança, muito por conta do impacto que essa sofrerá, incorporada onde não pertence, muito pela fragilidade da sua existência, da sua saúde quando lá vive. Os hospitais públicos que aceitam internar crianças dependentes da droga possuem poucas vagas e um mínimo de 12 anos de idade. Quando a internação é involuntária, não há no SUS ambulâncias e profissionais para resgatá-las.

Quanto aos recém-nascidos, no ano de 2016 foram registrados mais de 70 casos de abandono de bebês nos hospitais públicos, por mães usuárias. A competência de ONGs, institutos e programas governamentais de acolhimento dessas crianças é muito relevante, pois tratam com a vulnerabilidade da paciente destruída pela droga e incentivam que reorganizem suas vidas para poderem cuidar dos filhos. Com certeza, as que não conseguem são marcadas dolorosamente. Quando a tentativa é falha, as crianças são encaminhadas para a Justiça e postas em abrigos, também, em sua maioria, de muito bom zelo e empenho; e aguardam adoção ou atingir a maioridade.

O programa de Braços Abertos da gestão de Fernando Haddad (PT), iniciado em 2014, oferecia moradia em sete hotéis, três refeições diárias, um salário de R$15 por dia por varrição das ruas, além de tratamento médico contra o vício para resgatados. Dos mais de 400 beneficiários do projeto, em média, 40 são crianças, incluindo menores de 13 anos de idade. O maior problema enfrentado por esses jovens é a falta de higiene nos hotéis em que vivem, ficando expostos a um meio de vida insalubre que viola o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Ainda que não seja o melhor quadro, é a alternativa que famílias possuem a criar seus filhos nas ruas.

Contudo, a preocupação do governo quanto a existência de menores em meios instáveis é ainda questionável. O novo projeto do atual gestor João Doria, batizado Redenção, consiste em juntar medidas do programa de Haddad, no caso, manter as moradias em hotéis; com o programa do governo Geraldo Alckmin (PSDB), Recomeço, que tratava da internação compulsória. A ação de Doria no dia 21 de maio, na região central de São Paulo, com a demolição de imóveis ocupados, ameaças de internação à força e remoção de moradores, muitos dos quais, famílias; teve grandes consequências nas vidas de várias crianças. Em meio às invasões, PMs levaram documentos, roupas, materiais escolares, camas, fogões. Tudo isso serve para incentivar a entrada no seu programa. Porém, para onde serão realocados esses pais e filhos? Como serão lidados? Irão para os hotéis sujos e de péssimas condições? Quão efetiva é a ajuda aos jovens usuários, se colocados em internações involuntariamente? As atitudes do prefeito são duvidosas, pois não garantem um futuro melhor às crianças, sequer parece lembrar que estão ali também, desemparados e desprotegidos. Como acreditar que tais projetos não são meras políticas de higienização, quando vão contra a própria indicação da OMS e desrespeitam a dignidade do ser humano que vive na cracolândia, desaforam a vida da criança e seu direito à saúde, ao lazer, seu direito de existir em condições favoráveis?

É muito difícil tomar uma posição quando se trata de um assunto delicado e que parece interminável e sem solução como esse. E você, leitor, está convidado a deixar nos comentários o que tem a pensar do nosso mais novo prefeito, suas medidas políticas, sua visão das crianças e, se conseguir organizar a mente, da situação na cracolândia.

-Ticyane